Por João Gualberto

Convidado por Jorge Caldeira fui a sua posse na Academia Brasileira de Letras no último dia 25. Uma festa e uma celebração da obra desse grande intelectual. Historiador produtivo tem uma extensa produção, onde é difícil saber qual a mais importante. Seguramente o mais conhecido de seus livros é “Mauá: um empresário do império”, no qual destaca o papel do grande empreendedor do século XIX e sua luta contra a incrível burocracia imperial brasileira e também contra a mentalidade escravocrata que dominava os círculos de poder de sua época.

O livro sobre José Bonifácio de Andrada e Silva, é de uma profundidade extraordinária e coloca luzes sobre os movimentos políticos e econômicos que produziram nossa independência, que tem muito mais densidade do que o simbólico grito do Ipiranga, que aliás só ganhou importância depois da pintura de Pedro Américo. O quadro é de 1888, portanto do fim do período imperial. Até então o gesto simbólico tinha pouca importância. O que importava mesmo como símbolo da independência na época era a coroação de Pedro I em 01 de dezembro de 1822. Lendo o que Caldeira pesquisou e escreveu sobre a vida de José Bonifácio podemos entender melhor como ele foi fundamental na construção do Brasil, da invenção da nossa nacionalidade.
Outra obra fundamental é o “Banqueiro do Sertão”, onde ele narra o início do processo de descoberta do ouro no Brasil e os mecanismos de seu financiamento, aliás não só do ouro como também de todo o processo de interiorização das atividades produtivas na então colônia. Da leitura, a gente entende como faziam os bandeirantes para obter recursos para suas aventuras no sertão daqueles tempos. A trajetória do Padre Guilherme Pompeu de Almeida, é o fio condutor de uma história construída quase em forma de romance, onde fica destacado o empreendedorismo desses personagens. Jorge Caldeira destaca a formação do que ele chama do capitalismo Tupinambá, ou seja, a incrível articulação de culturas que nos produziu e que produziu nosso capitalismo. Isso não quer dizer que ele defenda que ouve igualdades nesse amalgama, antes pelo contrário ouve clara imposição da lógica cristã portuguesa.

Finalmente, a “História da Riqueza no Brasil”, o mais recente dos três, é uma obra síntese de suas formulações, onde fica claro o caráter empreendedor de nossa sociedade, muito mais ampla do que costuma descrever nossa historiografia tradicional. Muito me inspiro em Jorge Caldeira para tentar entender o que se passou no Espírito Santo. Nossa trajetória também é de muito empreendedorismo, que fica claro na fase colonial pela produção nas fazendas jesuíticas desde o século XVI até o ciclo do café, a partir da segunda metade do século XIX.
É falsa a afirmativa história de que fomos sacrificados pela coroa que estabeleceu a capitania do Espírito Santo como uma barreira verde entre o mar e as Minas Gerais. O ouro é importante – e põe importante nisso – no século XVIII. Portanto tivemos dois séculos de atividades econômicas antes da tal barreira verde. O ciclo teve seu auge nesse século. Logo depois chegariam ao Brasil as cortes portuguesas e começaríamos outro período. Portanto atribuir um certo marasmo colonial a um determinado período de um ciclo mais amplo é puro preconceito.
Artigo publicado originalmente no Jornal ES Hoje, no dia 30 de novembro de 2022.

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