Livro do escritor peruano Vargas Llosa discute como a banalização generalizada e a busca da autopromoção estão produzindo uma grande vítima: a política.
João Gualberto
Estamos construindo uma obsessão pelo entretenimento em um universo de frivolidades bancada pela busca permanente da autopromoção. Na minha opinião, nada expressa de forma mais clara a civilização do espetáculo, a busca da espetacularização do cotidiano do que a mídia das redes sociais. No Facebook, qualquer festa de família vira um espetáculo. Dizem até que essa rede social é uma espécie de festa de Natal em família – com suas delicias e chaturas – que dura o ano todo.
O programa Big Brother, exibido há 15 anos no Brasil, é outro bom exemplo da banalidade espetacularizada. São pessoas frívolas realizando atividades ainda mais frívolas e sendo seguidas por uma multidão igualmente desprovida de sentido crítico por semanas e semanas. Uma expressão acabada da civilização do espetáculo.

O assunto, que faz parte da vida de quase todos nós, também chamou a atenção do grande escritor peruano Mario Vargas Llosa, Prêmio Nobel de Literatura em 2010.
Vargas Llosa reuniu alguns ensaios, publicados sobretudo no jornal espanhol El País, e aprofundou os assuntos com outros textos e comentários em um delicioso livro chamado A Civilização do Espetáculo: uma radiografia de nosso tempo e de nossa cultura. Na verdade um título tomado de uma obra de Guy Debord: La Société du Spetacle de 1967.

A abordagem do escritor ao nosso tempo se dá sobretudo pelo deslocamento da cultura somente para a indústria da diversão, promovida pela força da publicidade. Para ele, o desaparecimento da crítica deixou um vazio que foi ocupado pela publicidade, que passou a ser parte integrante da vida cultural. Este vazio foi grandemente provocado pela perda de interesse da sociedade pelos intelectuais, uma consequência do ínfimo valor que o pensamento tem na civilização de espetáculo.
Politizando o tema, a banalização generalizada que a civilização do espetáculo produz, uma grande vítima: a política. Talvez a maior. Espetacularizada, ela torna-se escrava da autopromoção, da busca do marketing vazio pelos grandes atores sociais. Os cidadãos trocam a busca do conteúdo pelas fofocas e frivolidades dos grandes políticos.
O conjunto da sociedade, inclusive suas grandes instâncias de poder, vive assim um momento de estrelismos pessoais, sem uma grande liga que somente a cultura pode dar.
É evidente que é uma posição que Vargas Llosa toma e defende. Não todos precisam estar de acordo com ela, mas é importante levá-la em conta para tentarmos retomar o núcleo mais denso de uma civilização que pode se perder ao ficar banal de demais, esvaziada de uma vez de valores que solidificam a vida social. A vida política.
Neste vídeo, desenvolvido dentro do excelente projeto Fronteiras do Pensamento, o escritor peruano aborda o conceito de “cultura” em conferência homônima à obra, “A civilização do espetáculo”.